Ali, no meio da pista de dança, de olhos fechados a celebrar a sua juventude. Dezoito anos acabados de fazer. Sentia-se mulher, abanando as ancas ao som dos hits do momento. Sabia que era bonita, e que provavelmente deixaria Bruno ainda mais maluco por ela. Ele rodeava-a, tentando desesperadamente um seu olhar de aprovação. Todavia, Sofia continuava a dançar de olhos fechados. Cheirava o odor de Bruno que aprendera a identificar, e sabia-o perto de si.
Sofia não é uma jovem qualquer, é alguém com demasiados sonhos e muitas metas por cumprir. Tirar um curso superior e ser independente é apenas um dos seus objetivos. Quer casar e ter filhos, mas também quer viajar por todo o mundo. E pintar muitos quadros, e ganhar prémios como pintora. Ser reconhecida e chegar a velhinha rodeada por muitos netos e bisnetos. Já há algum tempo que tinha decidido perder a virgindade mal fizesse dezoito anos. Era mais um dos seus objetivos.
Ali, no meio da pista, Bruno e Sofia trocam sorrisos. Os dois corpos aproximam-se, as duas bocas também. Finalmente, beijam-se longamente. Sofia sente o corpo quente de Bruno. Sente também as suas mãos a avançar pelo seu corpo magro e moreno, avançam pela cintura, pela anca, avançam para as costas, para o peito.
Quando Sofia punha uma coisa na cabeça não havia ninguém que a convencesse do contrário. E como decidira perder a virgindade aos dezoito anos, estava determinada a cumprir tal objetivo. Queria crescer mais depressa para deixar de ser uma miúda, queria ser uma mulher.
Sofia vive num quarto alugado em Benfica. Os dois metem-se num táxi, sempre trocando carícias e muitos beijos. Bruno continua com os avanços, agora metendo-lhe a mão no sexo, por cima das calças. E de repente, Sofia sente choques por todo o corpo. Não está apaixonada por Bruno. Para ela, aquele rapaz representa apenas um meio para cumprir uma das suas metas.
Chegados a Benfica, já no quarto, Sofia e Bruno dançam ao som de Pink Floyd. Sofia permite que as mãos de Bruno naveguem por todo o seu corpo. Bruno tira-lhe o casaco, depois a camisola, as calças. E Sofia fica parada, ouvindo The dark side of the moon, sem saber o que fazer.
“Vem para a cama…”, sussurra-lhe Bruno. Ela, sentindo-se perdida e ofegante, deita-se na cama. Está com algum receio, mas decidida a cumprir a sua meta. “Tem que ser! Vai correr tudo bem.”, pensa ela. Olha para cima e observa uma teia de aranha. “Onde estará a aranha? Tenho que limpar o teto amanhã.”.
Na cama, deitada e à espera, Sofia aguarda. Bruno despe-se, ficando só de cuecas. Beijam-se e trocam carícias demoradas. Bruno tira o soutien a Sofia, ficando esta com os pequenos seios à mostra. Bruno observa o corpo perfeito de Sofia, beijando-a sofregamente. Beija-lhe também os seios, o umbigo, e vai descendo lentamente.

Tudo branco, Sofia começa a ver tudo branco. Já nem sabe onde está. Vê-se como uma menina de oito anos sendo agarrada à força, no meio de um campo de trigo. Vê-se estendida na terra, de barriga para baixo, observando apenas as mãos gastas e morenas do molestador. E vinham-lhe à memória flashes de uma violação que andou a reprimir durante dez anos. Os gritos que ninguém ouviu, as mãos manietadas, a penetração envolta em sangue. As ameaças. O medo e a agonia. A fuga para casa sempre em silêncio… Durante dez anos fizera tábua rasa de memórias demasiado dolorosas, recordações abafadas pelo instinto de sobrevivência.
Sofia, deitada na cama, abre os olhos e diz: “Não, Bruno! Desculpa, não posso”. Começa, então, a chorar. Bruno, abraça-a e cobre-a com uma pequena manta colorida. “Não há problema, Sofia! Fazemos só o que tu quiseres…”, diz-lhe o rapaz, apreensivo e preocupado. “Eu… Lembrei-me de algo… Aconteceu há muitos anos… Desculpa…!”, respondeu Sofia. Bruno tenta acalmá-la nos seus braços. Sofia, soube, naquele momento que provavelmente não conseguiria cumprir algumas das metas que delineara para a sua vida.
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